segunda-feira, 8 de setembro de 2008

O jogo

“Eu comecei aqueles encontros da mesma forma que ele: também não queria nada a sério. Quer dizer, eu achava que não queria nada a sério... Nos encontramos algumas vezes e sempre nos comportávamos do mesmo jeito: como velhos amigos que apreciam a companhia um do outro e só. Era engraçado porque às vezes eu me sentia como se estivesse montando um quebra-cabeça. A cada encontro ou conversa online, eu recebia pequenas peças, indícios de uma vida que se fazia ampla demais para ser revelada em apenas algumas horas. Acontece que aquela noite era diferente: eu finalmente soubera o resultado da OAB e agora um de meus sonhos se tornava realidade. Combinei com várias pessoas que iríamos comemorar. Como nos comportávamos como amigos, convidei o César também para ir e para a minha surpresa, ele topou. Vi-me, assim, surpreso porque ele era o tipo de pessoa que não se deixava levar facilmente, que se revela aos poucos numa tentativa vã de se fazer ainda mais interessante, sem saber que tudo aquilo, aquele mistério todo, só aumentava a minha curiosidade em pôr fim àquele jogo.

Naquela noite, eu pensei em César com um pouco mais de entusiasmo do que o normal. Escolhi a roupa com cuidado, fiz a barba, tomei banho caprichado e até passei um pouco mais de perfume do que o habitual. Ao sair de casa, lembrei de colocar um vinho na geladeira. Não era nada intencional, talvez um pressentimento...

A comemoração, numa churrascaria da cidade, foi muito divertida. Os amigos que eu juntara ali haviam sido pontos de apoio ao longo de uma faculdade cansativa e desafiadora. Todos eram parte de um processo e eu sabia que só desejavam o meu bem. Quando o César chegou, eu não pude deixar de reparar o quanto ele era atraente. Não que fosse bonito a ponto de querer apenas contemplá-lo, mas todo o conjunto fazia a diferença, afinal, juntar inteligência, boa aparência, senso de humor e um sorriso lindo numa mesma pessoa não parecia ser tarefa das mais fáceis. Todo mundo estava um pouco alto demais ao fim da comemoração. Umas poucas pessoas não haviam bebido, o que não era o meu caso. César perguntou se poderia me levar em casa e eu sem pensar muito, disse que sim.

Quando chegamos à minha casa, eu brinquei dizendo que tudo estava girando e que na verdade eu precisaria de um braço como apoio. Ele prontamente se pôs ao meu lado e me enlaçou para que eu me apoiasse nele. Eu realmente desequilibrei na escada, mas ele não me deixou cair. Nossos rostos se roçaram de leve, o que na hora me causou um certo estranhamento, afinal, éramos amigos e eu não podia confundir as coisas a ponto de desejá-lo. Só mais tarde, eu saberia que desde aquele momento, só o que eu queria era estar com ele. Ao abrir a porta, percebi-o um pouco mais afastado.

- Entra... vamos conversar um pouco...
- Acho melhor não... você está cansado. Deve querer descansar...
- Entra... tem um vinho na geladeira...

Ele abriu um sorrisão, desses que o sol se esconde com vergonha, e concordou. Involuntariamente, eu estiquei a mão, como se ele fosse uma criança, a qual devemos segurar para que não se afaste. Ele também segurou a minha e ao se chegar junto a mim, fechou a porta com um dos pés. Eu o conduzi até a cozinha, onde abrimos o vinho, nos servimos e ficamos nos encarando por alguns minutos. Ficamos numa espécie de jogo novamente, no qual ganhava quem não piscava ou soubesse descrever o outro com mais detalhes depois. Parecia não ter fim até que ele pôs o copo no balcão e num gesto brusco e impetuoso, me agarrou, beijando-me com intensidade. O susto foi apenas momentâneo, porque no instante seguinte, eu também o estava beijando, retribuindo toda a voracidade do momento. Respirávamos com dificuldade, pois o desejo era que nossas bocas não se afastassem. Ele passava a mão nas minhas costas, agarrando-me com vontade, deslizando os mãos pelo meu corpo, o que me fazia estremecer. Beijei-o no pescoço, acariciando seus cabelos, abrindo-lhe alguns botões da blusa social, para enfim, vislumbrar-lhe uma parte do torso nu, enchendo-me de coragem em passar a língua por onde houvesse um pequeno espaço. Quando nos percebemos estávamos deitados no chão da cozinha, abraçados, dividindo um momento de cumplicidade que até então eu não imaginara que poderia acontecer. Ele riu:

- Nós dois devemos estar bêbados...
Eu concordei, rindo e afastando cabelo dele do rosto.
- Então vamos tomar mais vinho... brinquei.

Pegamos a garrafa e fomos para a sala, onde ficamos no sofá, abraçados, trocando uns poucos afagos, quando na verdade, estávamos os dois nos contendo para ver quem avançaria o sinal mais rápido.

Na manhã do dia seguinte, às 11 horas, eu estava com um gosto horrível de “cabo de guarda chuva” na boca. Chamei-o, mas ele não respondeu. Enrolei-me no lençol, procurando-o pela casa, mas ele já devia ter ido embora, sem falar nada e sem deixar bilhete ou recado nenhum...

Disquei o número do celular, mas ele não atendeu. Liguei mais duas vezes e nada. Tomei banho e liguei o computador, enviando um e-mail, quase me declarando e agradecendo pela noite fantástica, mas me contive. Seria um outro pressentimento?

Dois dias se passaram. Achei estranho, pois ele não retornara as ligações que eu havia feito, não respondera os e-mails, não havia tentado nenhum tipo de contato. O que havia acontecido? Tivéramos uma noite juntos, uma bela noite juntos, mas ninguém prometera nada a ninguém e eu sabia disso. Eu tentava falar com ele, pois algo novo se desencadeara para mim, algo até então, desconhecido, um misto de prazer e ansiedade, uma vontade louca de vê-lo novamente para então, abraçá-lo, deitá-lo nu ao meu lado, e acariciar-lhe o rosto e os cabelos, numa espécie de confissão, quase um sinal de amor... Como talvez fosse difícil falar, eu deixaria que meu corpo expressasse... era necessário que ele soubesse de alguma forma.

O mais estranho foi que ele sumira de verdade. Se para mim era preciso falar, eu não tive mais a oportunidade, talvez eu nunca mais o visse, a não ser num desses meros acasos do destino, nesses que a vida se encarrega de fazer surpresa. Jamais retornou as minhas ligações, jamais digitou uma linha se quer via e-mail e eu me senti usado... o pior, eu me senti cansado por ter desprendido tanta energia em preocupações ou explicações desnecessárias. O jogo mudara agora e não havia mais peças a serem completadas. O divertimento agora era brincar de mágico e num de seus mais incríveis truques, César sumira, sem deixar rastros.”

14h37 – 08/09/2008.

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Antes que alguém me questione, esta é uma obra de ficção. Qualquer semelhança com histórias ou pessoas reais, terá sido intencional, hehehe. Há muitas fontes de inspiração e parte de mim, está escondida aí, quase perceptível na entrelinhas...

=) =) Abraços e boa semana!!! =) =)

2 comentários:

Digho disse...

HAuahuahua Ah eu não acredito! Como pode fazer isso comigo? hauah Eu devorei linha por linha reli trechos e no final era tudo ficção.:( Mas td bem é uma bela estória.Abraços amigo.
Sucesso!

Anônimo disse...

Melhor uma boa lembrança que um forte desejo não realizado...

Sempre VIVER!!!!

Abraços.

Conrado.